quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Impressões sobre o 1° Congresso de Moda

Vou aos poucos postando!


Impressões sobre o 1° Congresso de Moda do Brasil

O Parque Lage no Rio de Janeiro foi o local escolhido pela produção do evento, não poderia haver melhor local na cidade para se falar de Negócios de Moda reunindo os olhares de pesquisadores acadêmicos e de empresários e administradores de marcas de Moda.


A pesquisadora Dra. Nízia Villaça abriu a mesa falando sobre o tema proposto que era a moda como fenômeno cultural e a reflexão: “moda é só roupa?”. Pessoalmente acompanho os trabalhos da Nízia desde os tempos de graduação, quando o assunto é pesquisa de moda em seu viés sério, acadêmico, a pesquisadora sempre aparece com alguma contribuição em artigos, livros, publicações e citações de outros pesquisadores.  Além do pós- doutorado pela Sorbonne, Nízia é a professora titular da ECO – UFRJ. 

Levei meu livro que foi organizado por ela em parceria com a pesquisadora Káthia Castilho. O livro já estava cheio de anotações, marcações e uma aparência de velinho de tanto que eu usei, e foi nesse livro que no intervalo do evento pedi uma dedicatória – não pude deixar de cumprimentá-la, já que graças a pesquisa dela pude avançar muito nas minhas imersões sobre o universo da moda, cultura e sociedade.

Dentre muitas colocações a respeito do papel da moda na cultura atual – Nízia falou de um DNA na moda, nos deu uma ideia de uma dimensão onde tal DNA  transita entre a necessidade de se criar uma identidade, que por um lado seria construída voltada para um público consumidor: dessa forma com uma força de identidade bem delimitada, fixa e ligada ao life style, e por outro lado, a moda é paradoxalmente um sistema de transitoriedade, volátil, que morre para renascer constantemente – então esse DNA poderia ser a fórmula de sucesso das marcas que se destacam, que conseguem encontrar o equilíbrio entre criar uma identidade para seu posicionamento no mercado e ao mesmo tempo garantir novidades que alimentem os novos desejos do seu público consumidor.

A pesquisadora Bárbara Szanieck da Escola Superior de Desenho Industrial, trouxe um olhar mais voltado para os questionamentos sobre o lugar da moda não como apenas peças do vestuário ou só pelas suas características materiais, ela enfatizou que “moda” como linguagem, possibilita a produção de si mesmo e nesse processo, produz novas linguagens que por vez produzem novos mundos – não necessariamente representando o que existe, e sim possíveis fragmentos de mundos.

 A professora trouxe também um exemplo bem interessante de uma experiência realizada no próprio Parque Lage, anos atrás. Tratava-se de uma performance artística que utilizava a linguagem da moda, ou seja, um desfile de moda. Nesse contexto pessoas desfilavam não roupas, mas suas vidas em suas próprias roupas. Eram pessoas comuns, com problemas, dramas,  família e suas singularidades expostas ao público.
Bárbara também falou sobre formas diferentes de organização na moda, fez referência ao antigo modelo – o da pirâmide e comparou-o com um modelo mais dinâmico que ela chamou de “meta brand”, modelo caracterizado por uma movimentação horizontal que visa valorizar o social.
 
Patrícia Santana começou sua fala citando Baudrillard, disse que a moda engloba o indivíduo e o grupo e revela o gosto, que contém uma estética e uma ética. A pesquisadora propôs uma abordagem antropológica  para entendermos a relação que existe entre o sujeito que passa por diversos enfrentamentos sociais na sua rotina, se olha no espelho e precisa se gostar. Disse que esse gostar não é tão simples assim, que além de ser algo elaborado, está internalizado e ligado a dimensão do consumo de moda.

Patrícia falou um pouco sobre  como o consumo de moda é um ato fundamental na nossa cultura para formação da identidade individual e também do paradoxo, da identidade do grupo.

A professora discorreu sobre a moda em diversos contextos culturais e históricos e entrou no campo da discussão da cópia, lembrando que a cópia na educação acadêmica acontece sempre e tem o objetivo de fazer com que através da repetição você aprenda uma técnica.

Na moda a cópia sempre existiu, ela cita os processos copiados na Europa a partir do século XV entre países como Itália e França, assim como os americanos mais tarde fazem copiando os franceses - já no século XX. O mundo do Prêta-à-Porter  vai se alimentando entre os processos que são aprendidos e passam por releituras e desconstruções onde tudo é absorvido e uma nova linguagem é inventada, como os japoneses fazem bem ao desconstruir o ocidental adaptando a sua linguagem. Patrícia levantou a questão de se há ou não como delimitar as fronteiras do que podemos chamar de “cópia”.

Em um outro momento falou dos movimentos que a arte passou e como as discussões sobre a cópia se desenvolveram, deixando a questão sobre a apropriação de idéias como talvez pertinentes ao resultado final, que ocorre diante das infinitas apropriações de tudo que está no mundo das idéias e imagens, inclusive no contexto das mídias sociais onde uma imagem é gerada e compartilhada milhões de vezes, e nesse processo sofre intervenções que são agregadas: “eu crio a partir de algo, de algo que gosto”.

Uma observação importante da pesquisadora, foi com relação ao medo que alguns professores de design possuem em usar a palavra ou a ideia da releitura, na visão dela, essa palavra é às vezes proibida por parte de principalmente designers.

A apropriação na visão da pesquisadora, não ocorre só para continuar algo que já existe, às vezes pode ser para romper com algo e continuar de forma diferente. Citou um caso interessante sobre o punk atual que na verdade não corresponde ao punk no sentido original dos anos 70, ele produz uma imagem que se corresponde com a do punk, ele compra uma calça rasgada com cara de suja vendida na Diesel e não pretende ter o mesmo comportamento do punk do Sex Pistols, ele só quer usar aquele estilo.

Na segunda mesa a estilista  Luiza Marcier, dona da marca A Colecionadora e fundadora do Museu da Moda falou um pouco de como surgiu a ideia de criar um museu de moda e nos contou sobre suas pesquisas pelo mundo afora, conversando com representantes de museus na Europa, Estados Unidos, Japão, dentre outros tantos que ela nos mostrou em imagens. Chamou a atenção a forma como até em um mesmo país, pode haver mais de um museu que narra a história através da indumentária, mas que por conta do olhar diferente sobre a dimensão das roupas, acabam criando atmosferas estéticas e conceitos completamente distintos, como no caso que a estilista citou, de dois museus em Portugal com visões bem diferentes – ambas necessárias e de igual importância.

A história da Marquesa de Santos e de D. Pedro contada pela Luiza foi emocionante. Ela passou um clima que parecia até místico ao narrar os segredos que envolviam a casa que hoje é o museu e parece ainda guardar a aura do romantismo contido em seu significado ao longo da história.

Muito importante uma colocação da Luiza a respeito da visão distorcida que temos de nós mesmo enquanto brasileiros. Há uma naturalização que não corresponde a verdade em relação ao brasileiro e a cultura de museu. Luiza mostrou com dados tangíveis – em uma tabela, que o brasileiro gosta de museu e que a moda é muito valorizada pela sociedade em seu aspecto que envolve cultura, história e subjetividade. Os dados da exposição do Alexander MacQueen no Metropolitan estavam lá para comprovar: entre as mais visitadas. Museu nas palavras da estilista, significa uma atitude de um contexto que é muito maior, ele é uma plataforma para gente pensar, reunir e criar outras conexões, é a expressão cultural do vestir.

Por fim Luiza levantou as questões relacionadas à potência que é a moda em termos de números, elencou dados sobre a indústria, o mercado, o varejo (as feiras de moda brasileira), e por fim indagou: “Por que não fazer instituições e não eventos de moda?” – se referindo ao local (instituição) como um espaço para esse fluxo de pessoas que podem ali se encontrar, trocar, ter uma referência física para  encontros entre aqueles interessados no  tema.

Representando o Instituto Zuzu Angel, Lúcia Acar  arrancou suspiros ao apresentar a história da estilista que revolucionou a moda brasileira.  Nos contou como a costureira inovou, lutou, sofreu, protestou e fez fama mundialmente, abrindo para o Brasil a oportunidade de ser o que o país é, de se orgulhar pelas nossas mulheres criativas, pela nossa matéria prima local, pelo nosso artesanato e sobretudo pela ingenuidade colorida que é característica também de seu povo.

Parece que o Instituto criado pela Hildegard Angel, filha de Zuzu, está bem alinhado com o contexto da história e legado deixados pela ativista. Um dos objetivos do Instituto é promover e prestigiar a moda brasileira. Nada menos coerente se pensarmos que na época em que a costureira (como gostava de ser chamada) combatia com energia o que ela chamava de a colonização da moda, que era verticalizada, copiada a partir dos moldes da moda Européia, só valorizando o que era importado – Pelas palavras da Lúcia, Zuzu não era contra o estrangeiro, mas queria posicionar a nossa moda no mesmo lugar, e hoje nós sabemos o quanto a moda brasileira é valorizada “lá fora”.

A estética da moda da Zuzu acompanhou suas diferentes fases e vivências, ela retratava sentimentos através do uso de cores, formas e objetos que carregavam uma carga grande de significados em misturas únicas, gritavam o que a mãe do Brasil queria dizer ao mundo, com o peito apertado e a criatividade aflorada. Gritou tanto essa dor que acabou em uma trágica morte deixando a costura de uma vida, talvez a mais importante costura dessa inquieta- que buscava acima de tudo a justiça, em tudo que fazia.

Tal história e o empenho de artistas e de sua filha não podia resultar em nada menos do que um Instituto de Moda vinculado aos melhores centros de moda do mundo. Eles possuem parcerias com o ESMOD, L´Universite de La Moda, ESAD, Tirelli dentre diversos outros, que por vez permitiram a criação de outras ações como a Academia Brasileira de Moda: que prestigia os principais nomes de destaque do cenário da Moda no país.

Janara Morenna

Ele é “o cara” da Osklen. Vladimir Sibylla é o nome por trás de mais de uma década que marcou o sucesso da empresa.  Muitas vezes quando a questão era como uma marca consegue se posicionar tão bem em um mercado que esta crescendo e amadurecendo a ponto de servir de estudo de caso em diversas esferas do conhecimento – a resposta parecia simples: O Oskar tem o Vladimir.
Pensar em moda no Brasil hoje é sinônimo de elencar marcas, e com certeza a Osklen é uma share of mind nesse contexto.

A pauta do pesquisador era sobre a cultura organizacional e a memória empresarial na indústria. Usando termos como “sustentabilidade” da empresa, ele discorreu sobre conceitos do marketing voltado para o segmento moda e customizados para cada necessidade (empresa), e em como tangibilizar capital de conhecimentos para formação da marca através de uma cultura própria.

Parafraseando autores e utilizando-se de muitos referenciais teóricos das áreas de administração e sociologia, além das citações e gráficos; o expert em cultura organizacional deu uma ideia de como é complexo formar o “DNA da empresa”, ou seja, a “alma” desse corpo físico empresarial que  tem em uma marca forte o espírito do corpo da ideologia da marca.

Na visão do Vladimir, os recursos da empresa são de tamanha importância que ele considera como o “todo”, em seus aspectos tangíveis e intangíveis – da cultura material e social. A pesquisa e o desenvolvimento de ferramentas para se obter a informação (ou os códigos) podem trazer a cultura para perto, dessa forma ele criou um sistema de modelos de conversões de conhecimento, citou um case de uma coleção da marca, “móveis imutáveis”, onde profissionais da empresa de diversas áreas criativas saíram do centro (da fábrica, escritório, centro urbano) e foram para a periferia (no caso a Amazônia) para depois de colher as informações que dariam suporte à criação de um conceito para aquela coleção, voltar para o centro narrando com formas, design, cores, suportes imagéticos que se sobrepunham e dialogavam. Era a síntese daquele universo - pronto para o fast- fashion da cidade.

Janara Morenna.

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